É sabido por todos, que quanto mais a sociedade se moderniza, mais as relações humanas passam a ter novos contornos, outros significados, novos comportamentos, valores, enfim, tudo de acordo com o desenvolvimento social, cultural, político e econômico de cada momento da sociedade. No direito de família não é diferente, pois, com o passar dos anos podemos presenciar a existência de muitas alterações do que vem a ser considerado como família no Brasil.
A Constituição Federal, nos termos do art. 226, § 1º e § 2º, considera expressamente os seguintes tipos de família: a família Matrimonial (formada pelo casamento); no § 3º, temos a família Convivencial, (união estável) e no § 4º, temos a família Monoparental, (formada por um dos pais e seus descendentes).
O Código Civil, no seu art. 1.514, prevê a formação da família com o casamento de um homem e uma mulher, bem como, o reconhecimento da União Estável, entre o homem e a mulher, nos termos do art. 1.723.
Porém, o STF, em uma interpretação conforme, com fundamento no princípio da dignidade humana, art. 1º, III, combinado com art. 3º, III e o art. 5º, caput, da Constituição Federal, onde todos são iguais perante a lei, não devendo existir preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, deu esse novo olhar possibilitando o alargamento do entendimento de que a família, não se origina unicamente da união entre um homem e uma mulher.
Corroborando com esse entendimento, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no dia 14 de maio de 2.013, através da Resolução nº 175, possibilitou que os Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais, pudessem celebrar a união de pessoas do mesmo sexo.
Por seu turno, a VII Jornada de Direito Civil, aprovou o enunciado 601, com a seguinte redação: é existente e válido o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Em consequência dessas alterações retro mencionadas, fruto das evoluções, sociais, culturais e econômicas, a doutrina e a jurisprudência, passaram a reconhecer outras configurações de família, por isso, atualmente dependendo do doutrinador indicado, no Brasil podemos ter, um pouco mais, um pouco menos, de uma dezena de tipos de família existente no país.
Para Conrado Paulino da Rosa, na sua obra, Direito de Família Contemporâneo, na Constituição Federal, existem expressamente 03 (três) tipos de famílias (Matrimonial, Convencional e Monoparental) e 11(onze) tipos de famílias admitidas de forma implícita (Unipessoal, Anaparental, Moisaico, Extensa, Homoafetiva, Plúrima, Solidária, poliafetiva, Virtual, Coparentais e Multiespécie).
O fato concreto, é que a concepção do que é a família brasileira ao longo dos anos, vem sofrendo significativas transformações, dentre elas, vem se destacando a formação da família homoafetiva, que hoje já é reconhecida como tal, para efeitos legais, mais especificamente a possibilidade de registro de casamento e união estável e seus efeitos civis, dentre os quais, destaco a questão sucessória (patrimonial) e previdenciária, além da adoção de menores.
Nessa mesma linha, na busca de reconhecimento legal/jurídico, existem outras modalidades de família ganhando "força" e, devido sua existência fática, acabam "forçando" a legislação e o Poder Judiciário a se "adaptarem" a essas novas realidades, a exemplo da família poliafetiva, em que se nota uma pluralidade de pessoas que se relacionam entre si (mais que duas) com o intuito de constituir família, através da geração de prole, convívio público, estável, com coabitação e ciência de todos os envolvidos nessa relação da existência de uns e outros.
Sabe-se que, no Brasil a poligamia ainda é motivo de resistência do legislador quanto ao seu reconhecimento, por outro lado, a monogamia é um dos deveres do casamento, sendo inclusive prevista expressamente na legislação civil, porém, na realidade da população brasileira, o dever de fidelidade e monogamia no casamento ou união estável, e principalmente em relações mais "informais", há muito se tornou exceção.
Nesse sentido, o TJMA em decisão paradigmática (sendo um dos primeiros Tribunais do País) se debruçou sobre o tema e reconheceu uma união poliafetiva entre um homem e duas mulheres, gerando efeitos civis no campo sucessório/patrimonial para a mulher que mantinha uma união estável paralela com este homem que veio a falecer e era casado com outra mulher, sendo que todos os três tinham conhecimento uns dos outros e da natureza das respectivas relações. Em que pese críticas referentes a um possível ativismo exacerbado da referida Corte, haja vista a matéria ser de competência legislativa do Congresso Nacional, àquela época já se tinha um ato formal do Estado (Decisão Judicial) reconhecendo a validade de uma nova formação familiar (poliafetiva), embora até hoje não se tenha ainda legislação nesse sentido. Com efeito, acredito que em um futuro não muito distante, a legislação virá a reconhecer esta nova estrutura familiar, ampliando legalmente o conceito de Família.
Como se vê, na atualidade, temos diversas formas de constituição de família, aquelas tradicionais formadas pelo casamento, protegidas pelo Direito de Família e as com formações familiares modernas, que carecem de proteção pelo direito das famílias.
Apesar desses avanços, o STF em decisão apertada, 06 votos a 05, embora muito criticada por determinados setores, os Ministros referendaram um julgamento do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, que negou benefício de pensão por morte para a amante que mantinha uma união estável com o falecido e concedeu apenas para a mulher e a filha do casal, confirmando assim a monogamia no Brasil.
Diante dessa multiplicidade de entendimento do que é família, é que, na tentativa de cuidar melhor desse assunto, é que atualmente no Congresso Nacional, existem em tramitação Projetos de Lei, tanto para aprovar o Estatuto da Família, como para aprovar o Estatuto das Famílias. Isso porque, os congressistas não chegaram ainda a um consenso, sobre qual dos Estatutos aprovarem, uma vez que, tanto um como outro, além das questões jurídicas e politicas, envolvem questões de natureza, religiosas, patrimoniais, previdenciárias, sociológicas, éticas, morais e filosóficas, o que sem dúvidas, dificultam sobremaneira, a aprovação de qualquer um dos Estatutos.
Esclarecendo que, o Estatuto da família, prevê apenas a existência da família tradicional (união entre um homem e uma mulher), enquanto que, o Estatuto das famílias, admite outras configurações familiares, permitindo formação de famílias fora do casamento e sem que haja a necessidade, sempre de um homem e uma mulher, para que as mesmas não sejam discriminadas e que tenham a proteção do Estado, posto que, elas existem em grande número no Brasil. Eis o dilema.
Diante desse impasse, cada brasileiro, com base nas suas convicções (morais, religiosas, sociais etc.), se assim desejar, pode torcer livremente pela aprovação de um desses Estatutos ora em tramitação no Congresso Nacional.
José de Ribamar Viana.
OBA/MA 8.521.
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