A INFÂNCIA PERDIDA
Maria Luiza Santos
Gama (*)
Quantos são eles e elas? Por
que vivem nas ruas? E já não são somente meninos e/ou meninas, são adolescentes
e jovens também. Essa população hoje é surpreendentemente maior do que há duas
décadas. Eles e elas estão por toda parte: nos sinais de trânsito, (a grande
maioria); nos estacionamentos de veículos; nas ruas e calçadas movimentadas;
batendo de porta em porta (das residências, comércios, lojas). Pedindo (ou
furtando) para matar a fome (inclusive de seus familiares).
E outras questões que não
querem calar, saltam da boca: quantos são? E como foram parar naqueles lugares?
E a estas acrescentamos outra que deveria ser a mais importante e por que não
dizer a mais urgente: o que fazer para solucionar a problemática de (re)tirar
tantas “pessoas” da condição de “trabalhadores menores de rua”, pedintes,
explorados, drogados? O que falta ao nosso País para promover a mudança e
(re)integrar “eles” e “elas” na família
e na sociedade? Sim, porque todos certamente um dia saíram de uma “família”. Já
nem falamos na família tradicional, essa constituída de pai e mãe, num país de
tantas famílias alternativas, em maior número por falta de “alternativas”, e
raras vezes por escolha. Mas este é assunto para mais tarde, talvez para outra
oportunidade.
E por que será que já
tendo se passado duas décadas da promulgação do Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA (13 de julho de 1990), documento considerado um instrumento
jurídico e uma medida radical para a mudança de situações de risco, de
violência, de negligência, de discriminação, de exploração, de crueldade e de
opressão contra a Criança ou Adolescente, se constatou um aumento acelerado na
população de rua?
O fenômeno de crianças e
adolescentes de e na rua está por toda parte, em todas as regiões e estados
brasileiros, em uns mais que outros, mas não há nenhum que esteja livre de tal
fenômeno. E não adianta procurar culpados, porque ou são todos ou nenhum. Todos
são responsabilizados: Estado e Sociedade. Embora nem todos estejam envolvidos.
A responsabilidade de todos está ali, expressada no artigo 4º do ECA –
É
dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público
assegurar, com, absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida,
à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
comunitária.
E segue o mesmo parágrafo
afirmando que deve ser garantida com prioridade: proteção e socorro em
quaisquer circunstâncias; atendimento nos serviços públicos; preferência na
formulação de políticas públicas; destinação de recursos públicos nas áreas
relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Tudo que uma criança ou
adolescente precisa para satisfação de suas necessidades básicas e para o
atendimento aos seus direitos civis estão ditos nesse Estatuto. E para sua
execução os agentes também estão elencados. Por onde começar? Será pela
família, a primeira na lista dos nomes elencados? Essa é uma ordem para ser
seguida ou o fato de ser a primeira não foi intencional? Bem, deixando de lado
esse “detalhe”, passemos ao que interessa. O fato é que como afirma Maria Stela
em sua obra Pedagogia social de rua, “não basta apenas procurar conhecer as
causas do fenômeno, é preciso agir”. E foi assim que a sociedade civil,
distintas em organizações populares e sociais, que através de mecanismos
democráticos intervieram nos destinos do Estado, enquanto promotor de políticas
públicas sociais e de um novo reordenamento jurídico da nação, em relação à
infância e adolescência, - o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Depois desse “parto”
passou-se a divisão das responsabilidades entre governo e sociedade civil, e
constituíram-se os Conselhos de Defesa dos Direitos das Crianças e dos
Adolescentes, Os Conselhos Tutelares e os Fundos da Infância. E para desvelar
as diferentes manifestações da sociedade civil, o governo criou as Conferências
como espaços de deliberações, de momentos avaliativos e de controle para saber
se estamos cumprindo com as nossas responsabilidades ou apenas nos livrando
delas. E dessa vez com a participação daqueles que são o objeto em questão: as
crianças e os adolescentes.
As discussões sobre o
fenômeno de meninos e meninas de rua têm ocorrido com frequência, o que falta,
e isso a realidade desnuda nos mostra, é ação, ou então essa “população” não
teria aumentado tanto nos últimos anos, mesmo com o ECA para reordenar
juridicamente esse fenômeno.
Nesse sentido, podemos
considerar a elevada quantidade de meninos e meninas de rua como um sinal para
“denunciar” as mazelas e as desigualdades sociais que o sistema socioeconômico
produziu nessas duas últimas décadas no Brasil.
É preciso avançar no
combate das causas já conhecidas e pesquisar para conhecer novas causas e
combatê-las. Claro! Porque assim como o fenômeno se modifica suas causas
também. E enquanto não chegamos à solução do problema, eles e elas estão lá! Na
rua, e vão sobrevivendo, quase sempre à custa de paliativos das autoridades, e
com algumas iniciativas particulares de organizações da sociedade civil.
Iniciativas pedagógicas
como da Pedagogia Social de Rua de Maria Stela Graciani, são necessárias para
ajudar no entendimento e na compreensão da questão social presente na sua obra.
Além de despertar um olhar reflexivo, para o trabalho dos segmentos sociais
comprometidos com a melhoria das condições de sobrevivência, proteção e
desenvolvimento das crianças, adolescentes, jovens, meninos e meninas de e na
rua que perderam ou perdem, os melhores anos de suas vidas - a Infância - onde
se constrói na inocência característica dessa fase, sonhos e lembranças que as
acompanham por toda a vida.
Quem nunca viu uma criança
ou adolescente perambulando pelas ruas de alguma cidade deste imenso país
chamado Brasil? Mas com que olhar? O visível ou o invisível?
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