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CRISE SANITÁRIA OU CRISE POLÍTICA:
O QUE SE PODE APRENDER PARA NÃO SE REPETIR NO PRÓXIMO CENTENÁRIO? 

     Quem olhar desatenciosamente apenas perceberá uma entre as muitas crises que o nosso país está inserido. E não é surpresa dizer que atinge a cidade centenária de forma intensa, aliás, são os idosos que estão condicionados a serem deixados a míngua caso haja colapso no sistema único de saúde, alguns países tiveram que fazê-lo. Mas para um município cem anos não lhe traz velhice, percebe-se maus tratos desde o seu nascimento.
     Há crises e a mais forte delas, causando metástase, é essa provocada pelo capitalismo que desencadeia: sobrevida e desigualdade; insegurança e violência; e, obscurantismo e corrupção. O capitalismo, apesar da pandemia, ainda não se encontra em crise, não, não é a crise do capitalismo, falo das crises que ele desencadeia que causam tanto mal ao ponto de  alguns pensarem que o próprio sistema capitalista esta ruindo. Não sou economista, no entanto, arrisco-me aludir que tão somente esse modelo está, aos poucos, caindo em suas contradições e constatações.
     A pandemia evidenciou os sinais de sobrevida e desigualdades, ainda que tenha colocado todos na mesma linha da morte, independente de sua condição e status  social. A partir da propagação da COVID-19, veio à luz, sem véu, que a maioria das famílias não tem condições para garantir higienização e afastamento social adequados por mais de quinze dias, pois desde o consumo de água e sabão à falta de alimentação poderia acontecer. Enquanto poucos  milionários se cuidam, a maioria das pessoas não tem o direito de se permitir bons tratos, pois para esta expressiva parcela da população pouco ou quase nada é o que lhe chega. As desigualdades foram notadas pelos que já são marginalizados, acentuadas nas piadas de mau gosto com entonação de desejo daqueles que tendo um bom salário, adquirido por emprego digno ou não, como aquela proferida por Roberto Justus e tantos abastados emergentes que esquecem as suas raízes.
     A insegurança e a violência também tiveram o seu pico, revelando o puído do aparelho do Estado – tão vulnerável quanto os cidadãos e cidadãs – desprovido dos insumos básicos e sujeito às pressões da marginalidade e do tráfico e, em alguns casos, envolvido, esse aparelho está roto, embora se desdobrando em ações pós evento e quase nunca de forma proativa. As famílias compreenderam mais ainda o conceito de insegurança quando este foi notado também na escassez dos produtos da cesta básica, da farmácia básica em tempos de pandemia. Essas famílias notaram que sua imunidade é baixa porque vivem em total insegurança alimentar, deram-se conta que não tem condições de ficarem em afastamento social, pois em suas casas habitam juntas seis, oito, dez ou mais pessoas, veio a tona que vivem em insegurança habitacional. Amontoados em casas pequenas e sob a cultura do machismo a violência domestica aumentou, crianças e mulheres são as maiores vítimas.
     Por falta de transparência nas relações, quaisquer que  sejam elas, por Informações carregadas de ódio e mentiras, por todo esse obscurantismo o capitalismo alimentou, potencializou e nominou alguns dos tantos corruptos espalhados por aí, a maioria ocupa cargo público, mandato político e tem altas empresas ou empresas fantasmas no ramo; Alguns destes corruptos estão desfilando por nossas vistas e nós fingimos que está tudo bem.
     Nesse ponto já não dá mais para se evitar tratar da crise política que também é fomentada pelo sistema capitalista. Vejamos, a pandemia retratou a fraqueza e quase ineficiência do Sistema Único de Saúde – SUS no preciso momento em que a mídia revelou a ausência total ou parcial de equipamentos de primeiros socorros: máscaras, luvas, jalecos; leitos de UTI proporcional a população uma vez que há parâmetros pré-estabelecidos e, sobretudo, quando trouxe a tona a ausência de respiradores mecânicos. Uma significativa parcela da população não sabia da existência de tal aparelho e a totalidade ficou pasma ao tomar ciência da inexistência deles na maioria das unidades de tratamento intensivo.
     Concluo essa reflexão com a pergunta título desse texto ampliando-a: estamos mesmo em crise sanitária ou crise política? O que se pode aprender para não se repetir no próximo centenário?
Será usado aqui o conhecimento adquirido no Caderno de Formação – 2: Direitos Sociais para Superar a Crise, publicado pelo Programa Justiça Econômica, Grito dos Excluídos/as Continental, Pastorais Sociais/CNBB, Comissão Brasileira de Justiça e Paz, Rede Jubileu Sul e CAFOD. O documento sugere:
1 Direito de decidir 
     O poder popular precisa ser melhor e de fato exercido para que os direitos sociais sejam garantidos. Tome decisão por sua capacidade de analisar os fatos, os cenários e os atores. Busque consenso com quem você confia que não lhe usará para servir aos seus próprios interesses. 
2 A Vida no centro de tudo
     Decida e exija que os recursos públicos que chegam ao município ou são gerados por ele sejam aplicados integralmente em políticas públicas para atendimento das demandas/carências da população. Políticas públicas não são favores, são direitos já conquistados que vem sendo negados ou ofertados parcialmente, descaracterizando o valor, a importância e a centralidade da vida. Para efetivar a sua participação em defesa da vida componha os Conselhos de Direito, são instrumentos de controle social.
3 Direito à Assistência e à Previdência
     É imprescindível que ninguém viva na miséria e na pobreza extrema; Faça-se assistência com o cuidado de não aprofundar a marginalização. O trabalho autônomo ou assalariado, individual ou coletivo precisa ser incentivado e garantido através de formação continuada com qualificação da mão de obra, criação ampliada de postos de trabalho, abertura de investimento de novas empresas. Garantia de assistência médica em quantidade e qualidade suficientes, de forma preventiva de modo a minimizar a medicina curativa, mas em se necessitando, que o sistema de saúde esteja estruturado e equipado. Garantir o direito a previdência, seja através de benefícios emergenciais ou os contínuos como é o caso das aposentadorias, se o trabalhador e a prefeitura recolhem, pois que não lhe seja negado no final da carreira.
4 Direito à Segurança
     “Como se busca uma paz que seja qualidade da convivência social, a Segurança só deverá ser repressiva quando esgotadas as possibilidades de dialogo e acordos” (p.32). “Nessa sociedade que ama a paz não haverá lugar para meios de comunicação que lucram com a difusão das agressões à lei, dos escândalos, da violência, das mortes; pelo contrário, os meios de comunicação deverão ser mediadores do direito humano à comunicação”... A mudança de postura no modo de produzir e consumir deverá melhorar a nossa relação com a Terra que vive gemendo em dores de parto.
5 Direito de nascer e de ser criança e jovem
     Redução da mortalidade neonatal, assegurado pré natal zelando pelas vidas da mãe e do recém nascido. Garantia de lazer, arte, cultura e educação como como meio de superação do trabalho infantil. Evitar que crianças e jovens trabalhem para sustentar as suas famílias, para isto é necessário ampliar, monitorar e garantir a geração de emprego e renda dos adultos.
     Parabéns, Bacabal.
Liduina Tavares – membro fundadora da Academia Bacabalense de Letras – Cadeira N° 11 – patroneada por frei Silano

Comentários

  1. O passando não se pode apagar, ficará para sempre no campo da análise, mas o futuro esse, esse sim, pode ser mudado a partir de atitudes justas, conscientes e honradas no presente. Quem quer mudar o futuro trabalha no presente!

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  2. Texto que devia estar na mesa de todo bacabalense amanhã para refletir.

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  3. Realidades e proposições muito bem apresentadas Liduina. Oxalá todos se preocupassem seu umbigo e com o do próximo também, para que a vida seja contemplada, de fato, como uma dádiva dos céus.

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